segunda-feira, 23 de abril de 2012

Histórias para a vida (5) - O eterno dilema entre o velho e o novo


Ninguém põe remendo de pano novo em veste velha; porque o remendo tira parte da veste, e fica maior a rotura. Nem se põe vinho novo em odres velhos; do contrário, rompem-se os odres, derrama-se o vinho, e os odres se perdem. Mas põe-se vinho novo em odres novos, e ambos se conservam. (RA)

O ser humano resiste às mudanças. 

Trabalhei no departamento de sistemas de uma empresa de porte médio no final dos anos 80. Como foi difícil convencer os antigos compradores, contadores e chefes de recursos humanos que os resultados dos computadores eram, sim, confiáveis. Embora no começo o trabalho fosse grande, as conferências parecessem intermináveis, quando tudo estivesse implantando e funcionando redondinho, o trabalho poderia ser feito em muito menos tempo. Mas ninguém queria dar o braço a torcer. Eles tinham trabalhado na ponta do lápis durante toda a sua vida e sempre funcionou. Por que é que agora uma meia dúzia de iluminados (como nos chamavam) achava que ia conseguir fazer melhor?
 

Naquela época no Brasil nem se falava em computador pessoal, o PC. Toda essa briga era para conseguir processar os dados dos diversos departamentos em mini-computadores, cujas CPU´s ficavam numa sala com ar condicionado. Quando caía a energia era uma correria para abanar o bicho, senão ele torrava. Os back-up´s eram enormes panelões que se guardavam em cofres. Depois de árduas batalhas, quando os antigos estavam quase se dobrando, começaram a aparecer os pequenos micros de mesa. Ai, ai, ai! Começou tudo de novo. Eram pilhas de reclamação, de gente com medo de perder o emprego, de acomodados que não queriam aprender como lidar com aqueles "monstros". A gente se sentia ator de filme de ficção.
 

Fico imaginando o sorriso irônico no rosto de quem está lendo esta coluna em pleno século 21. Contar isso para essa geração Internet é certeza de ouvir piadinhas do tipo: "Ei, tio, faz tempo isso, hein?". "Ah! Isso é história do século passado!!" A gente se sente pré-histórico. Mas quem viveu esta época saberá aquilatar a importância e a dificuldade da mudança.
 

Esta é a principal lição de "remendar roupa velha com tecido novo". A roupa velha já "laceou" o que podia, não estica mais. Já o pano novo ainda consegue e até pede. Eles não combinam. Um vai acabar tirando o espaço do outro. E no fim, todos perdem. É como guardar vinho fresco em embornais de couro que já estão curtidos. Dá rachadura, rompe o frasco e o vinho se derrama.
 

Quando se limita o coração e a cabeça, fica difícil colocar alguma coisa nova ali. Quando uma cabeça já esticou ao máximo, já deu o que tinha que dar, já chegou no limite, é preciso trocar de cabeça. Cristo está sugerindo a necessidade de uma mentalidade que se possa renovar.
 

Esta é uma característica que fascina no cristianismo. Porque cristianismo não é algo estático, inerte, pusilânime. Isto não tem nada a ver com cristianismo. Cristianismo é coisa de quem tem flexibilidade. É coisa de quem percebe o tempo passar não apenas para ficar contando histórias saudosistas, mas para ter coragem de reconhecer que chegou a hora de arrumar um odre novo para colocar o vinho novo. Odres que nos serviram durante um tempo às vezes precisarão ser abandonados hoje. Caso contrário, perderemos a chance de experimentar coisas novas que Deus tem preparado para nós. Deus, sábio como é, não vai permitir que a sua novidade se estrague, derramando-a sobre as nossas vidas, se nossa mentalidade são odres velhos, já suficientemente esticados, que precisam ser substituídas por algo novo.
 

Este é um momento delicado. Pode passar a falsa impressão de que tudo o que se fez não valeu nada; de que estamos desprezando o trabalho dos outros. Mas lembre-se de que não são as pessoas que estão pedindo isso de nós. Quem está pedindo isso é Deus. Ele quer uma transformação que venha pela RENOVAÇÃO da nossa mente. Deus criou um mundo que não pára. Estamos sempre em movimento. A vida continua, companheiros cristãos. O trem da história não parou ainda.
 

Também não nos esqueçamos de que tudo o que hoje é velho um dia já foi novo. Tudo o que é tradicional, um dia esteve nos seus primeiros dias. E o que hoje chamamos de novidade, um dia não servirá mais. A lição não é só para quem hoje não consegue se livrar do velho de ontem, mas também para os que amanhã não conseguirão se livrar do novo de hoje.
 

Não nos apeguemos demasiadamente ao odre. Quem se agarra ao odre, deixa de experimentar o vinho. O odre é a estrutura, o método, o jeito de fazer, a forma, o chamado
 modus operandi. Não é isso que importa. Não é por isso que vale a pena brigar. Isto tudo é odre. O que interessa mesmo é o vinho. 

Enquanto muita gente briga e se divide por causa do odre, tem outros bebendo vinho estragado. Enquanto alguns brigam por causa da cor do remendo, não percebem que a roupa está se rasgando e expondo o corpo nu à vergonha desditosa. Vamos concentrar no que interessa. Sejamos genuinamente cristãos, dispostos a receber vinho novo.
 

Lembre-se de que o Senhor trabalha na contramão, no imprevisível. Normalmente, o vinho para ser bom precisa ser velho e o melhor vinho fica para o fim. Quando, porém, Cristo transforma água em vinho nas bodas de Caná, os elogios para o noivo foram no sentido de que o vinho novo estava melhor.
 Se deixarmos Deus derramar seu vinho novo sobre as nossas vidas, poderemos experimentar a realidade nunca vista de um cristianismo autêntico, eficiente, dinâmico e real. Se, no entanto, continuarmos a discutir por causa dos odres, nunca teremos esta experiência. Nunca foi grande negócio tentar limitar Deus à nossa visão pequena, ao nosso odre antigo, à nossa roupa velha e rasgada. 

Sabe o que aconteceu quando, finalmente, conseguimos informatizar a empresa? Tornamo-nos a 3ª maior do país no nosso ramo de atividade. Foi o maior boom, o período mais próspero e auspicioso de uma empresa que já existia há 20 anos.
 

Valeu a pena insistir e investir na mudança de mentalidade.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Histórias para a vida (4): Linha aberta

Porque o Filho do Homem veio salvar quem está perdido. O que é que vocês acham que faz um homem que tem cem ovelhas, e uma delas se perde? Será que não deixa as noventa e nove pastando no monte e vai procurar a ovelha perdida? Eu afirmo a vocês que isto é verdade: Quando ele a encontrar, ficará muito mais contente por causa dessa ovelha do que pelas noventa e nove que não se perderam. Assim também o Pai de vocês, que está no céu, não quer que nenhum destes pequeninos se perca.

A existência humana está reduzida a um número no cadastro. Você é um R.A., um R.G., um CPF, um CNPJ. Nossa vida é marcada por números perdidos em meio a milhões de outros. Em grande parte de nossas atividades, somos apenas um número. 

A impessoalidade é a marca do nosso tempo. Você liga para o banco, não fala mais com uma telefonista. Fala com uma fita. É maltratado pela companhia aérea, não fala mais com um gerente. Escreve um e-mail. Vai ao supermercado e quer dar uma sugestão, precisa escrever tudo e colocar numa caixinha (que me parece nunca é aberta...). Quer fazer amizades? Nem precisa sair de casa: abra o Facebook e em breve você terá uma porção de amigos virtuais, aos quais você provavelmente nunca verá e se pudesse vê-los e saber mais sobre eles talvez ficasse decepcionado. As pessoas não têm tempo para você. Elas não querem parar e ouvir. Há muito o que fazer, problemas a resolver, decisões a tomar, metas a cumprir. Até para comer hambúrguer você é um simples número. Você vai ao balcão do Mc Donald´s e o atendente grita: "Eu tenho um número 5!" A rigor, o que aconteceu foi que o RG 16.678.987, morador no imóvel matrícula 23X2345, casado com o RG 15.456.876 pediu um número 5 e isto foi a venda nº 1.276.768, às 14h37. Caramba!
 

Até mesmo igrejas agem assim. "Temos culto aos sábados à noite, domingos de manhã e domingos à noite. Faça sua escolha. Se precisa de salvação, venha domingo à noite. Se é jovem, venha sábado. Se tem criança em casa, venha domingo de manhã. Sente em seu lugar e cresça. É tudo o que temos a oferecer." É o tempo da praticidade, da facilitação, do pragmatismo. Vamos trabalhar no atacado, porque isso reduz custos. Meia dúzia de pregadores por mês dão conta do recado. Um reluzente luminoso na frente de um belo templo, boa música e uma mensagem. Para quê mais?
 

Algum tempo atrás, conversei com um missionário estrangeiro que serve a Deus no Brasil há muitos anos. Em visita à sua terra natal, foi a uma igreja para cultuar a Deus. Entrou, cantou, ouviu a mensagem, saiu e não foi "importunado" por ninguém. Uma igreja tipo fast food, coisa moderna. Peça pelo número.
 

Seguindo os passos de Jesus Cristo pelos evangelhos, encontramos um modelo bem diferente. Pense nos extraordinários encontros dele no Evangelho de João. Este evangelho bem poderia ser chamado de "O Evangelho da Ovelha Perdida". Veja quantas pessoas ele encontrou em particular: 
André (1:40), Simão Pedro (1:42), Felipe (1:43), Natanael (1:48), Nicodemos (3:1-15), a mulher samaritana (4:1-26), o oficial romano (4:46-53), o homem enfermo no tanque de Betesda (5:5-8), a  mulher "pecadora" (8:10,11), o cego de nascença (9:35-38), Maria de Betânia (12:1-3), Maria Madalena (20:11-16), Tomé (20:27) e novamente Pedro (21:15-18).

Em cada caso, uma revelação especial, um encontro transformador, uma oportunidade nova, uma mão estendida, uma solução. Por que se importar com Nicodemos, se os fariseus tanto faziam para persegui-lo? Por que conversar com Pedro, que dias antes o negara aberta e completamente? Por que se envolver com a história de uma mulher de reputação duvidosa, acusada de adultério? Por que parar ao meio-dia para conversar com uma samaritana no meio da rua? Por que aquele doente e não tantos outros em redor daquele tanque? 

Porque Jesus não é pastor de atacado. Para ele, ninguém é um número. Jesus não se preocupava com os números do IBGE, mas com um coração pulsando dentro do peito. Mesmo porque as estatísticas falam em 1% de perda. Uma ovelha perdida em 100 é um resultado fantástico. Mas Ele precisava falar com pessoas individualmente porque sabia quão cara é uma única alma aos seus olhos. 99 estão seguras, mas tem uma que precisa de salvação. É por isso que Ele tinha tempo para as pessoas. Ele queria conquistá-las. Queria mostrar a elas que seu caminho de devassidão e indiferença as levaria a um fim desastroso e irreversível.
 

Sempre me emociono quando penso na cena de Maria Madalena no cemitério no domingo da ressurreição. Que sentimentos, que reações, que susto, que alívio, que coquetel de pensamentos lhe atingiram o coração quando uma voz tão conhecida e meiga quebra o silêncio daquela manhã, chamando-a pelo seu nome: "Maria!" Não uma voz de censura, mas uma voz de consolo. E Tomé? Duvidou, achou que os outros estavam loucos, só ia acreditar se pusesse a mão nas feridas do Mestre. Uma semana depois, ele está lá. Ao invés de ouvir algo do tipo "Por que você faltou da reunião na semana passada?", ele recebe do Senhor um alento à sua fé. Parece até que Jesus vai até lá naquele dia só para isso. Para Cristo, Tomé não é apenas "um dos doze". Ele é Tomé.
 

Que bom saber que o Pastor e Bispo da minha alma nunca me falta. Não preciso ficar esperando na linha por meia hora para depois ser atendido por uma gravação do anjo Gabriel: "Você ligou para o céu. No momento não podemos atender. Deixe seu recado e assim que possível entraremos em contato." Não. A linha está sempre aberta. Tenho um novo e vivo caminho que meu Pastor me consagrou pela sua própria vida. Tenho acesso contínuo à presença dele. Ele pára o mundo para me ouvir.
 

Um dia ele olhou para mim como se eu fosse a única criatura a precisar de sua bênção. Você poderia estar entre as 99; eu era aquela por causa de quem um dia ele parou tudo. Somente para me salvar.
 

Nunca encontrei alguém assim.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Histórias para a vida (3): Talento pra que?

Jesus continuou: O Reino do Céu será como um homem que ia fazer uma viagem. Ele chamou os seus empregados e os pôs para tomarem conta da sua propriedade. E lhes deu dinheiro de acordo com a capacidade de cada um: ao primeiro deu quinhentas moedas de ouro; ao segundo deu duzentas; e ao terceiro deu cem. Então foi viajar. O empregado que tinha recebido quinhentas moedas saiu logo, fez negócios com o dinheiro e conseguiu outras quinhentas. Do mesmo modo, o que havia recebido duzentas moedas conseguiu outras duzentas. Mas o que tinha recebido cem moedas saiu, fez um buraco na terra e escondeu o dinheiro do patrão. Depois de muito tempo, o patrão voltou e fez um acerto de contas com eles. O empregado que havia recebido quinhentas moedas chegou e entregou mais quinhentas, dizendo: "O senhor me deu quinhentas moedas. Veja! Aqui estão mais quinhentas que consegui ganhar." "Muito bem, empregado bom e fiel", disse o patrão. "Você foi fiel negociando com pouco dinheiro, e por isso vou pôr você para negociar com muito. Venha festejar comigo!" Então o empregado que havia recebido duzentas moedas chegou e disse: "O senhor me deu duzentas moedas. Veja! Aqui estão mais duzentas que consegui ganhar." "Muito bem, empregado bom e fiel", disse o patrão. "Você foi fiel negociando com pouco dinheiro, e por isso vou pôr você para negociar com muito. Venha festejar comigo!" Aí o empregado que havia recebido cem moedas chegou e disse: "Eu sei que o senhor é um homem duro, que colhe onde não plantou e junta onde não semeou. Fiquei com medo e por isso escondi o seu dinheiro na terra. Veja! Aqui está o seu dinheiro." "Empregado mau e preguiçoso!", disse o patrão. "Você sabia que colho onde não plantei e junto onde não semeei. Por isso você devia ter depositado o meu dinheiro no banco, e, quando eu voltasse, o receberia com juros." Depois virou-se para os outros empregados e disse: "Tirem dele o dinheiro e dêem ao que tem mil moedas. Porque aquele que tem muito receberá mais e assim terá mais ainda; mas quem não tem, até o pouco que tem será tirado dele. E joguem fora, na escuridão, o empregado inútil. Ali ele vai chorar e ranger os dentes de desespero."

Seu amigo vai passar um ano no exterior. Você fica no apartamento dele. Primeira semana, sua filha está aprendendo a escrever e revela sua nova capacidade com belíssimos hieróglifos na estante de jacarandá, madeira de lei, tratada, rara e, principalmente, cara. Você torce como nunca para seu amigo arranjar emprego e ficar por lá mais dez anos. Que tremenda responsabilidade!

É este o sentido da palavra "mordomia". Administrar o que é dos outros. Cuidar do que não lhe pertence. É o serviço do despenseiro. E o que se espera dos despenseiros "é que cada um deles seja encontrado fiel." É assim que o Mestre descreve nossa vida. Somos responsáveis por cada dádiva que Deus nos dá. Tudo o que somos e temos são, na verdade, coisas que Deus nos confiou para que tomemos conta. Um dia ele vai nos pedir contas de cada uma delas. E não são poucas.

Pense no nosso corpo. Uma intrincada máquina biológica, não totalmente desvendada pela ciência. Nosso cérebro, por exemplo, é tão pouco conhecido que ainda merece investimentos de milhões de dólares em pesquisas a cada ano. Tanto potencial e às vezes tão pouco usado... Nossa visão, nossos sensores, nosso raciocínio. Para que Deus nos preparou um recurso tão extraordinário, que nem anjos e principados tem? Segundo o Paulo apóstolo, para glorificarmos a Deus (I Co 6:20). Por isso, quando o usamos para mera exibição de curvas e músculos, estamos reduzindo infinitamente seu propósito e fazendo dele um uso extremamente inconveniente. Ou quando o usamos como um parque de diversões, para a satisfação dos prazeres que ele pode proporcionar, estamos "escondendo dinheiro na terra". Isso vai nos custar caro.
 

E o nosso tempo? Quando somos jovens, achamos que ele é inteiramente à nossa disposição e que nunca vai nos faltar. Podemos esbanjá-lo, abusar dele à vontade. Raramente o encaramos com a seriedade que precisamos. Usamos grande parte dos nossos dias de juventude frivolamente. Dizia a canção que "o futuro é uma astronave que tentamos pilotar". Acreditamos nisso. Achamos que podemos conduzir nosso destino e que no momento em que quisermos, podemos recuperar o tempo perdido. Esquecemos de que se há uma coisa que jamais pode ser recuperada é exatamente o tempo. Dinheiro, fama, prestígio, emprego, posição social, bens materiais, isso tudo você pode recuperar. Mas o tempo não. Por isso Moisés disse que um coração sábio é aquele que aprendeu a contar os seus dias. E o sábio Salomão disse que é melhor aproveitar o tempo que somos jovens para nos dedicar a Deus, porque chegarão dias ruins, dos quais a gente vai querer se livrar e quando não teremos mais força para fazer o que gostaríamos. Já dizia o filósofo Smilingüido, "quem não tem tempo para Deus, vive perdendo tempo".
 

Além disso, se você é um cristão, deve saber que Deus lhe deu dons espirituais, quer dizer, capacidades especiais para fazer algum trabalho no seu Reino. É triste perceber como grande parte dos cristãos nem se preocupa com um assunto de tanta importância como este. Muitos que conheço sequer se dedicaram a descobrir qual é o dom que receberam. Acham que isso é coisa para quem for fazer seminário ou para quem está pensando em ser missionário. Não sabem que é algo que Deus lhes deu para ser usado e menos ainda sabem que Deus pedirá contas do uso que fizeram disso. Passam seu tempo nas igrejas sem qualquer envolvimento ou compromisso, enquanto seus dons vão enferrujando até ficarem inativos. Administram mal o que Deus lhes confiou.
 

Também recebemos de Deus muitos bens. Dinheiro, carro, casa, equipamentos de toda sorte. É o que chamamos de "nossa vida material". É como se o cristão fosse uma espécie de loja de departamentos. Cama, mesa e banho no térreo. Som e imagem no primeiro andar. Móveis no segundo e assim por diante. De onde tiramos este conceito de vida material e vida espiritual como duas coisas separadas e incongruentes, é difícil dizer. Posso afirmar que não foi da Bíblia. Tudo o que somos pertence a Deus e precisa ser encarado como parte da nossa vida cristã. Deus está tão interessado na maneira como você gasta seu dinheiro como na maneira como você o cultua no domingo de manhã. Até porque uma coisa será o reflexo da outra. Você só saberá como usar seus bens materiais se aprender primeiro como adorá-lo adequadamente. Quem não pensa assim, acabará com as prioridades de sua vida completamente invertidas e terá muito pouca utilidade para Deus.
 

Adiciona a esta lista a sua formação acadêmica. Muitos de nossos pais não tiveram a oportunidade de chegar onde chegamos em termos de estudos. Estou certo de que Deus não depende do conhecimento humano para realizar seus propósitos no mundo, mas fico pensando nas inúmeras oportunidades que se abrem na vida da igreja brasileira, no momento em que grande parte de seus jovens membros estão se tornando médicos, dentistas, advogados, pedagogos, assistentes sociais, engenheiros, enfermeiros, fisioterapeutas, músicos e tantas outras atividades. Se este extraordinário exército de profissionais compreender que Deus não lhes permitiu esta bênção apenas para encherem seus bolsos de dinheiro (como o Mar Morto, que recebe água mas não a compartilha com ninguém), mas para que sejam canais de bênção para outros, não dá para imaginar o que pode acontecer no nosso país nestes últimos dias. Não é à toa que Deus tem dado este privilégio à nossa geração.
 

Que uso fazemos daquilo que Deus nos confiou? Que importância damos a esta questão? O que nos dirá o Dono da propriedade quando ele vier pedir contas do que recebemos para administrar?

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Histórias para a vida (2): Meu caderninho de 490 páginas

Leia o Histórias para a vida (1) e acompanhe o restante da série, que será postada diariamente durante duas semanas. 


Então Pedro chegou perto de Jesus e perguntou: - Senhor, quantas vezes devo perdoar o meu irmão que peca contra mim? Sete vezes? Não! - respondeu Jesus. - Você não deve perdoar sete vezes, mas setenta vezes sete. Porque o Reino do Céu é como um rei que resolveu fazer um acerto de contas com os seus empregados. Logo no começo trouxeram um que lhe devia milhões de moedas de prata. Mas o empregado não tinha dinheiro para pagar. Então, para pagar a dívida, o seu patrão, o rei, ordenou que fossem vendidos como escravos o empregado, a sua esposa e os seus filhos e que fosse vendido também tudo o que ele possuía. Mas o empregado se ajoelhou diante do patrão e pediu: "Tenha paciência comigo, e eu pagarei tudo ao senhor." O patrão teve pena dele, perdoou a dívida e deixou que ele fosse embora. O empregado saiu e encontrou um dos seus companheiros de trabalho que lhe devia cem moedas de prata. Ele pegou esse companheiro pelo pescoço e começou a sacudi-lo, dizendo: "Pague o que me deve!" Então o seu companheiro se ajoelhou e pediu: "Tenha paciência comigo, e eu lhe pagarei tudo." Mas ele não concordou. Pelo contrário, mandou pôr o outro na cadeia até que pagasse a dívida. Quando os outros empregados viram o que havia acontecido, ficaram revoltados e foram contar tudo ao patrão. Aí o patrão chamou aquele empregado e disse: "Empregado miserável! Você me pediu, e por isso eu perdoei tudo o que você me devia. Portanto, você deveria ter pena do seu companheiro, como eu tive pena de você." O patrão ficou com muita raiva e mandou o empregado para a cadeia a fim de ser castigado até que pagasse toda a dívida. E Jesus terminou, dizendo: - É isso o que o meu Pai, que está no céu, vai fazer com vocês se cada um não perdoar sinceramente o seu irmão.

Já ouviu ou já disse alguma vez algo do tipo: "Eu perdôo, mas..."? Pois é, foi exatamente para ensinar esta a lição que Jesus contou esta parábola. Não foi para dizer que dívidas não precisam ser pagas, mas para mostrar que sempre seremos devedores quando se trata de ofensa e perdão. Nunca estaremos isentos de tratar desta questão enquanto estivermos neste mundo. 

Lá vem o irmão Pedro, com seus cálculos. Se eu perdoar 7 vezes, isso dá uma vez por semana. Tá ótimo! Quem vai ser o abusado que vai querer me ofender mais do que isto? Ok, Pedro, mas sua conta está errada. Você precisa estar pronto a fazer mais do que isto. 70 vezes 7.
 

Bem, isto não é tão ruim. Passo na papelaria mais próxima, compro um caderno numerado e começo a anotar data, hora, nome e telefone daqueles que me ofendem. Eu perdôo, mas... anoto no caderninho. Perdôo, mas... não esqueço. Perdôo, mas...vou lançar isso em rosto toda vez que tiver uma chance. Perdôo, mas... o Brasil inteiro vai saber o que você fez comigo. Eu perdôo, mas... em 1945, às 14h30 daquele dia chuvoso de maio você me disse isso ou aquilo.
 

Não fica claro que este raciocínio vai na contramão do que Jesus acabou de ministrar? De fato, esta história é uma belíssima ilustração do que ele já havia ensinado quando fez a chamada Oração do Pai Nosso: 'Perdoa as nossas ofensas como nós temos perdoado os que nos ofendem'.
 

Deus nos perdoou uma dívida de milhões. Impagável. Sufocante. Mortal. Com que a pagaríamos? Teríamos que nos tornar escravos para sempre e mesmo toda uma eternidade de sofrimento não seria suficiente para esgotá-la. Jamais conseguiríamos. Mesmo que nossos parentes tentassem por gerações depois da nossa morte, "os seus recursos se esgotariam, porque a redenção da alma é caríssima" (Sl 49:7,8). Simplesmente impossível. Havia uma conta contra nós, uma promissória implacável, um escrito de dívida a nos prejudicar. Então, o próprio Filho de Deus desce e vem pagar nossa conta. Ele não devia nada, tinha todos os méritos, todos os recursos. Paga com sua própria vida, quita a duplicata, remove o débito. É assim que Paulo descreve esta transação:

Deus perdoou todos os nossos pecados e anulou a conta da nossa dívida, com os seus regulamentos que nós éramos obrigados a obedecer. Ele acabou com essa conta, pregando-a na cruz. (Colossenses 2:13,14)


Por que o rei perdoou o seu servo? Algum merecimento? Folha de serviços prestados? Interesse pessoal? Investimento para o futuro? Não acredite. A razão está no texto: teve pena dele. Foi graça pura. Foi uma decisão unilateral e só podia ser assim. Era para o rei que o servo devia e só ao rei cabia a decisão de perdoar. E assim se fez.
 

Até hoje funciona assim com a graça de Deus. Perdoar é uma prerrogativa divina. Até os maus fariseus sabiam disso, tanto que questionaram Jesus quando ele perdoou os pecados de um paralítico a quem acabara de curar: "Quem pode perdoar pecados, senão Deus?" É contra Ele que pecamos, é a Ele que devemos. A única coisa que coube ao servo foi reconhecer sua condição e implorar por misericórdia. Isto gerou no rei a compaixão que levou-o perdoar a dívida. 
Deus espera unicamente um coração contrito e quebrantado. Uma atitude de reconhecimento da miserabilidade da nossa condição. Uma declaração de incapacidade, de dependência. Isto basta. 

Nós não temos disposição para perdoar dívidas de umas poucas moedas. Somos mesquinhos, regrados, medidos, contados quando se trata de negociar a dívida que os outros têm conosco. Quantas vezes devo perdoar? Até quando preciso suportar isso? Não há uma brecha no cristianismo que justifique minha atitude de não aceitar esse desaforo? 

É incrível, mas algumas vezes até conseguimos inventar algumas justificativas para nossa atitude de não perdoar. Digo isso porque muitos desamores e atitudes amargas no meio do povo de Deus são praticados em nome de Deus. Na suposta defesa da honra do Seu nome (como se Ele precisasse de alguém para defendê-lo), na suposta defesa dos "princípios bíblicos" e até mesmo na descarada defesa de nossa imagem e de nossa reputação, podemos chegar até as últimas conseqüências. Não é raro encontrar um cristão sacudindo o outro pelo pescoço e esbravejando: "Pague o que me deve!". São incontáveis os casos daqueles que vão para a cadeia do esquecimento, do cerceamento, da mordaça, da censura e dali não saem enquanto não "pagarem suas dívidas". São incontáveis os que ficaram marcados na vida, estarão marcados para sempre. Pior, grande parte dessas "dívidas" foram injustamente produzidas pelas artimanhas dos que querem ter o controle sobre as igrejas e sobre as pessoas, outras tantas engendradas por boatos e línguas ferinas, outras criadas por aqueles que sentem inveja e ciúme. Nem todas as dívidas são dívidas de fato. O que fazer quando isso acontece? Só tem um jeito (obrigado, Jesus, por esta dica): vá contar ao Patrão. Ele é justo e tomará as providências.
 

A lição central desta parábola é que precisamos cultivar um coração perdoador. Em outras palavras, precisamos ter sempre prontidão para perdoar. Levando em conta o que Deus nos perdoou, nenhuma ofensa será mais grave ou mais difícil de ser perdoada. Devíamos muitos milhões. Perdoamos algumas moedas. O cristão que diz "eu não perdôo", seja abertamente seja pela atitude, precisa rever sua fé.
 

Observe que esta parábola não é uma licença para pecarmos contra o próximo o quanto quisermos. Não é salvo-conduto para sairmos pela vida apedrejando os nossos conservos. Não é desculpa para ofendermos os outros porque não conseguimos refrear a nossa língua. Lembre-se de que a Bíblia não ensina o pecado abundante, mas a graça abundante.
 

Outra lição importante. A dívida dos servos era real. Não era fictícia. Não era inventada. Eles realmente deviam. O perdão não deve ser banalizado, desmerecido. Perdão se dá quando há ofensa de verdade. Há muito tempo que os cristãos têm usado este texto para fazer com que o mundo se curve aos seus pés. Está cheio de gente que "se ofende" com a mesma facilidade com que trocam de camisa todos os dias. Quando se vai ver mais de perto, amiúdo se percebe que esses tais são na verdade os verdadeiros ofensores, que se utilizam pessimamente de um recurso tão caro e importante como o perdão para conseguir o que querem: bajulação e veneração dos homens.
 

Seria necessário, neste momento em que você lê estas palavras, jogar fora algum caderninho escondido em alguma gaveta da sua alma? Há pessoas que você colocou numa lista negra, que passaram da conta com você? Ou será que você tem abusado do perdão, exigindo que as pessoas o perdoem sem vigiar para que você não as ofenda de novo?
 

Trate isso com o Rei. Você vai ser muito mais feliz se agir do jeito que Jesus ensinou.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Histórias para a Vida (1) - Antes de começar

Por que Jesus falou em parábolas? Resposta simples e automática: para explicar bem as coisas que ele queria dizer e para que o povo entendesse melhor. Certo? Lamento, mas segundo o que ele próprio disse, a resposta está no mínimo incompleta. Leia você mesmo a explicação de Jesus para o seu gosto por parábolas:

"É por isso que eu uso parábolas para falar com eles. Porque eles olham e não enxergam; escutam e não ouvem, nem entendem. E assim acontece com eles o que disse o profeta Isaías: "Vocês ouvirão, mas não entenderão; olharão, mas não enxergarão nada. Pois a mente deste povo está fechada: Eles taparam os ouvidos e fecharam os olhos. Se eles não tivessem feito isso, os seus olhos poderiam ver, e os seus ouvidos poderiam ouvir; a sua mente poderia entender, e eles voltariam para mim, e eu os curaria! - disse Deus." (Mt 13:13-15 BLH)

Em um sentido, é justamente pela razão oposta do que parece que Jesus falou por parábolas. Ao invés de ser para ajudar pessoas a entender, ele queria mesmo era complicar! Não é intrigante? Não lhe soa estranho? Mas você notou a citação de Isaías que Jesus usou para corroborar sua atitude? Eles não queriam saber. Não tinham ouvidos dispostos a ouvir nem corações inclinados a aprender. Era um povo enfatuado e orgulhoso que, na sua esmagadora maioria não somente descreu dele como finalmente o rejeitou abertamente, a começar dos líderes religiosos.

A exceção foi os discípulos. Quando ele "manifestou a sua glória, seus discípulos creram nele" (João 2:11). E então Marcos, o evangelista, nos revela que 
"usando muitas parábolas como estas, Jesus falava ao povo de um modo que eles podiam entender. E só falava com eles usando parábolas, mas explicava tudo em particular aos discípulos." (Mc 4:33-34 BLH). Quer dizer, aqueles que creram podiam compreender, porque ele interpretava-lhes o sentido do seu ensinamento. 

Assim, iniciamos com uma grande lição sobre essas preciosas parábolas: coisas espirituais são ao mesmo tempo tão simples que podem ser ilustrados com histórias quase infantis. Mas ao mesmo tempo, são tão profundas que só podem ser compreendidas pela fé sincera e pelo coração aberto a ouvir e praticar a voz de Deus. 

Para entender o ensino de Jesus, não são necessários anos de seminários ou de estudos acadêmicos. Os fariseus, escribas e sacerdotes eram versadíssimos nas Escrituras. Eram doutores em Bíblia. Podiam esfregar a Bíblia na sua cara e dizer orgulhosamente que conheciam de cór trechos inteiros dos quais talvez você nem tenha ouvido falar. Só que tudo isso não passava de conhecimento teórico. Quando Cristo chegou e revelou-se ao mundo, eles ficaram escandalizados. Todo o seu preparo acadêmico caiu por terra. Não raro é o que acontece com muitos que saem das escolas bíblicas e seminários hoje em dia. Sem generalizar, é claro. Mas tem muita gente perdendo a fé no seminário. 


Outra tremenda lição é que nem sempre a noção correta de quem é Jesus e a compreensão correta do que ele ensina e quer de nós pertence aos mais antigos, aos mais famosos e aos mais poderosos. Isto se mostrou verdadeiro na época de Jesus, na Idade Média, nos avivamentos mundiais e ainda se mostra verdadeiro nas igrejas de hoje em dia. Disse o poeta: "a sabedoria mora com gente humilde". Pessoas simples e iletradas, como os pescadores galileus Pedro, Tiago e João, poderiam calar todo um ilustre Sinédrio quando falassem em nome de Jesus. A eles foi dado conhecer os mistérios do reino.
 

Qual é a sua atitude diante das Histórias Para a Vida que Jesus contou? Não me refiro aos comentários que me propus a fazer nesta coluna para as próximas semanas, mas às palavras que ele mesmo proferiu e que foram registradas para nós. Como você se aproxima delas? Isto equivale a perguntar: Por que você vai à igreja? Por que carrega uma Bíblia? Por que canta hinos de louvor a Deus? Por que se diz um cristão? É isto o resultado de uma fé sincera e fervente, de uma compreensão, ainda que turva e fraca, mas correta, de quem Jesus realmente é?
 

Você pode ser líder, grande, poderoso, famoso, influente, dentro e fora de uma igreja. Se não compreender, através da fé, quem Jesus É, jamais compreenderá o que ele DIZ. Você será sempre daquele time que ouve e não entende, que olha e não enxerga. Pode até pregar muito bem, como faziam os fariseus e escribas. Pode escrever coisas bonitas sobre Jesus. Os escribas e saduceus o faziam. Mas vai seguir sendo apenas, com todo o respeito, um tapado.
 

Creia. E permita que sua fé o leve a uma atitude correta em relação a Jesus e ao seu ensino. Isto tem o poder de transformar uma vida.



Acompanhe o restante da série, que será postada diariamente durante duas semanas.